12 de setembro de 2011

Entrevista com Patrícia El-moor, ativista do Movimento Libertação Animal Brasília

No dia 08 de outubro várias cidades do mundo celebram o Dia Mundial Contra a Crueldade Animal e Brasília também está engajada nesta causa. O movimento LIBERTAÇÃO ANIMAL BRASÍLIA, em parceria com outros grupos ligados a causa animal, prepara uma manifestação na capital da República. Será das 16:00 às 19:00 (dia 08/10/2011), na Fonte Luminosa da Torre de TV. Estão previstas atividades educativas, lúdicas e artísticas, além de tendas temáticas com distribuição de material informativo sobre temas relacionados à causa, tais como veganismo, proteção animal, abolição animal, exploração de animais em rodeios, uso de peles e vivissecção e experimentação animal. Patrícia El-moor, ativista do Libertação Animal Brasília e uma das organizadoras do evento, concedeu esta entrevista ao jornalista Sandro Neiva.

SANDRO NEIVA - O que é e como atua o Movimento Libertação Animal Brasília?

Patrícia El-moor - O Libertação Animal Brasília foi criado no início de 2011 para sensibilizar a sociedade brasiliense em relação a temas polêmicos tais como especismo, vivissecção, experimentação em animais etc. A razão para isso foi a manifestação pelo fim da vivissecção e experimentação animal, organizada pela atual representante da Weeac no Brasil, Norah André, ativista bastante respeitada na luta pelos direitos animais, que, no primeiro semestre deste ano propôs a realização de uma manifestação de forma sincronizada, no dia 16 de abril, em várias capitais brasileiras. Brasília foi uma das cidades manifestantes e o Libertação Animal Brasília coordenou as ações na capital federal. A partir de então, este projeto se tornou uma das referências na luta pelos direitos animais no DF, ao lado de outros grupos e coletivos e vem expandindo sua rede de ativistas envolvidos e engajados com a causa animal. Aproveitamos para dizer que gostaríamos de consolidar este grupo para que juntos possamos organizar projetos de médio e longo prazo na capital federal e neste sentido convidamos as pessoas interessadas a juntarem-se a nós. Entrem em contato por meio do nosso blog www.bsblibertacao.blogspot.com.

Muitas vezes, os argumentos e reflexões em defesa dos direitos dos animais são descartados prontamente pelo cidadão comum e rotulados pelo cidadão com formação mediana como passionais, sentimentalistas, fanáticos, idiossincráticos, etc. Como mudar este quadro?

Esta é uma realidade que pouco a pouco começa a mudar. A contribuição de filósofos e pensadores dos direitos animais nos últimos 30 anos tem permitido cada vez mais argumentar de forma muito bem embasada sobre esta questão. Entre as principais contribuições para que o tema ganhasse a relevância que começa a ganhar, é possível citar as investigações realizadas por entidades bastante respeitadas, que vem denunciando cada vez mais os maus tratos impostos aos animais, a mobilização da sociedade com o intuito de expressar seu repúdio a este tipo de exploração e, ainda o fato de que própria causa animal passou a despertar interesse e adesão por parte de muita gente do meio acadêmico, artístico e anônimo.

Como a questão da ética está vinculada ao direito animal?

Ética e direitos animais estão intrinsecamente relacionados, porém, falar sobre isso não é algo trivial e o que quer que eu responda, demandará muitas referências que tomariam toda a entrevista. Esta relação é tão forte e tão importante que existem congressos e seminários – nacionais e internacionais, voltados apenas para esta questão. Neste sentido, recomendo fortemente às pessoas interessadas que procurem material publicado de filósofos dos direitos animais que abordam esta questão de forma bastante aprofundada e com suas respectivas nuances, pois há diferenças em suas argumentações e matrizes teóricas. Entre eles, é possível mencionar Gary Francione, Tom Regan, Peter Singer e Bernard Rollin.

No princípio de setembro será realizado em Brasília o IX Congresso Brasileiro de Bioética, além de um simpósio relacionado à medicina veterinária. Como este tipo de evento é avaliado pelos ativistas do direito animal?

Além deste evento que você mencionou, cabe lembrar também que no dia 15 de setembro, será realizado o I Congresso Brasileiro de Bioética e Direitos dos Animais, evento que acontecerá em Curitiba – Paraná, realizado por iniciativa da Ordem dos Advogados Seccional Paraná e do Instituto Abolicionista Animal, de Salvador. Os ativistas dos direitos animais estão sempre atentos a estes eventos e, quando possível, se empenham para estarem presentes. É fundamental para a causa que nós estejamos sempre atualizados com relação a tudo que está sendo discutido no âmbito dos direitos animais, seja do ponto de vista acadêmico, político etc. É graças a este cuidado em conhecer cada vez mais que a causa está se fortalecendo e se tornando objeto de atenção em todo mundo. Muito embora a ação prática de grupos como a Frente de Libertação Animal (ALF) tenham obtido avanços para a causa há algumas décadas, sua forma de atuar é envolta por certa polêmica e tanto a mídia quanto autoridades de vários países passaram a combater este tipo de ativismo. Esta é uma das razões pelas quais o movimento dos direitos animais vem se firmando também por outros meios, como através da presença recorrente em eventos e encontros relacionados à filosofia, ética, economia, segurança alimentar, política etc.

No mês passado foi criada no Congresso Nacional uma Frente Parlamentar em Defesa de um suposto “bem estar” para animais que vão para o abate. Esse tipo de política pública está em sintonia com os ideais de vocês?

De forma muito resumida, seria possível dizer que o movimento dos direitos animais hoje se encontra dividido entre aqueles que buscam e se contentam com o chamado “bem-estarismo”, o qual não vê problema algum no uso e exploração dos animais desde que não lhes seja imposto sofrimento, e aqueles chamados abolicionistas, os quais visam combater toda e qualquer forma de exploração animal por entenderem que não há argumento lógico que prove que sua existência é para servir aos seres humanos. A respeito da Frente Parlamentar, ainda é cedo para prever como será sua atuação. Há indicativos de que existe uma vontade destes políticos em ouvirem e conversarem com todos os grupos relacionados ao movimento dos direitos animais. Não saberia afirmar se isso será feito.

Porém, do meu ponto de vista, por mais que a vertente abolicionista rejeite a maior parte das propostas desta frente, por considerá-las bem estaristas, o diálogo e até mesmo o conflito é fundamental para amadurecermos nossa luta. Como diria Georg Simmel, cientista social alemão que viveu entre os séculos XIX e XX, existe no conflito a capacidade de transformação e construção de novas realidades. Ele não deve ser encarado apenas como algo negativo, como o senso comum costuma compreender. Muitas vezes, é por meio do conflito que a convivência entre lados antagônicos se torna possível, fazendo parte da nossa própria socialização.

Noto que falar hoje de uma ética para os animais é ainda visto com certa suspeição e até desprezo por alguns setores acadêmicos. De que forma as universidades e a comunidade acadêmica mundial tratam a questão do direito animal?

Nos últimos anos tem sido possível observar uma mudança em relação a isso. Para ilustrar o que eu digo, vale citar o lançamento no início de 2011 do The Journal of Animal Ethics, primeiro periódico sobre ética animal, fruto de uma colaboração entre acadêmicos dos EUA e Inglaterra, e entre o Centro de Oxford pela Ética Animal e a University Press, Imprensa da Universidade de Illinois (http://www.press.uillinois.edu/journals/jane.html ). No Brasil, também é possível citar a Revista Brasileira de Direito Animal, primeira revista relacionada com o atual debate sobre o Direito Animal na América Latina, coordenada pelos Promotores de Justiça de meio ambiente do Ministério Público do Estado da Bahia, Heron Santana e Luciano Rocha Santana, fundada em 2006 e com a periodicidade anual. http://www.abolicionismoanimal.org.br/revistas.php?cod=17

Até pouco tempo a experimentação com animais era uma prática vista como moralmente aceitável pelos ramos de ciência e tecnologia em geral, que aliás, determinavam que era “um assunto deles”. Hoje já existe um diálogo com a sociedade civil?

Na verdade, a preocupação com o sofrimento animal via experimentação e vivissecção não é de todo recente. Sérgio Greif & Thales Tréz em “A verdadeira face da experimentação animal”, dedicam um capítulo a esta questão, o qual eu reproduzo apenas um trecho para mostrar que essas práticas sempre foram combatidas no passado, ainda que no início do século XX elas tenham sido quase que ofuscadas pela “propaganda” de que eram necessárias (lembrando que houve casos em que avanços só foram possíveis graças a essas práticas, porém, eticamente falando, para os abolicionistas isso não torna o argumento em prol da utilização dos animais válido) fazendo com que muita gente se conformasse com tal sofrimento. Hoje em dia, com cada vez mais informações e avanços científicos, a sociedade volta a se posicionar de forma mais crítica em relação a esta questão.

“A primeira lei a regulamentar o uso de animais em pesquisa foi proposta no Reino Unido, em 1876, através do British Cruelty to Animal Act. Porém, esta não vem a ser a primeira lei de defesa animal existente. Em 1822, já havia sido instituída a Lei Inglesa Anti-crueldade (British Anticruelty Act), que era também conhecida como Martin Act, em memória de seu defensor Richard Martin (1754-1834), e era aplicável apenas para animais domésticos de grande porte. Antes mesmo desta havia uma outra lei proposta na colônia de Massachussets Bay, em 1641, que propunha que: ‘ninguém pode exercer tirania ou crueldade para com qualquer criatura animal que habitualmente seja utilizada para auxiliar nas tarefas do homem’.

No século XIX foi que surgiram as primeiras sociedades protetoras dos animais. A primeira foi criada na Inglaterra, em 1824, com o nome de Society for the Prevention of Cruelty to Animals. Em 1840 esta Sociedade foi assumida pela Rainha Victória, recebendo a denominação de Royal Society (RSPCA). Em 1845 foi criada na França a Sociedade para a Proteção dos Animais. Em anos posteriores foram fundadas sociedades na Alemanha, Bélgica, Áustria, Holanda e Estados Unidos. A primeira publicação norte-americana sobre aspectos éticos da utilização de animais em experimentação foi proposta pela Associação Médica Americana em 1909.”

Que limites devem ser impostos à experimentação com animais?

Os abolicionistas certamente serão unânimes em dizer que não existe avanço ou progresso científico ou tecnológico que valha a pena se ele ocorrer mediante o sofrimento e a exploração de qualquer ser vivo, humano ou não. Os bem estaristas provavelmente levarão em conta uma equação que envolve o mínimo de sofrimento imposto aos animais e a real necessidade de sua utilização para que se avalie esta questão dos limites.

Qual é a real situação no Brasil? Existe alguma lista de empresas vilãs, que utilizam a experimentação animal, de forma que as pessoas possam fazer um boicote?

Existem vários sites que disponibilizam estas listas. O boicote a essas empresas é uma excelente forma de pressioná-las a buscar alternativas que não envolvam testes em animais e, assim, irem ao encontro de uma tendência que já começa a ganhar terreno em várias partes do mundo. Por exemplo, a partir de 2013, a UE terá que proibir a venda de todos os novos cosméticos e produtos de higiene pessoal que tenham sido testados em animais, mesmo fora do espaço UE.

Aqui no Brasil várias marcas começaram a informar sobre a não realização de testes em animais para vários produtos, muito embora, para alguns itens o teste seja obrigatório de acordo com a legislação brasileira. As listas das empresas que testam e não testam em animais pode ser encontradas em vários sites. Aqui estão alguns:

http://www.arcabrasil.org.br/animais/ciencia/testes.htm

http://www.pea.org.br/crueldade/testes/

http://www.guiavegano.com.br/vegan/por-que-usar-produtos-veganos/produtos-veganos

É importante observar que existem listas também de itens e empresas que não utilizam qualquer tipo de produto animal em suas composições. Estas listas também ganham cada vez mais adesão, pois muitas pessoas, a fim de adotarem um comportamento coerente com o que preconizam, não apenas evitam produtos que foram testados em animais como não utilizam ou consomem produtos, alimentos ou vestuários que levem matéria prima animal. Dito isto, é importante mencionar que o veganismo é um estilo de vida que respeita de forma integral os direitos animais.

Uma frase do filósofo gaúcho Carlos Naconecy me chamou muito a atenção. Disse ele: “A pior forma de desrespeitar uma criatura é ‘coisificá-la’ como algo comestível”. Corroborando com sua ideia, pergunto eu: antes de nos preocuparmos com os animais de laboratório, não deveríamos primeiro nos preocupar com os milhões de animais que são abatidos diariamente para a alimentação dos seres humanos?

É o que os abolicionistas fazem, ou seja, procuram adotar uma forma de vida coerente com sua visão de que os direitos animais são tão relevantes e importantes quanto os direitos humanos e, por isso, não existe razão que justifique sua exploração, seja ela de que forma – para alimentação, vestuário, diversão, cura etc. Este, inclusive, é um dos pontos de conflito entre as perspectivas abolicionista e bem-estarista no âmbito do movimento animalista.

Dia 08 de outubro é o Dia Mundial de Combate à Crueldade em Animais. Haverá alguma manifestação em Brasília?

O evento do dia 08 de outubro foi concebido pela WEEAC, que, em inglês significa literalmente Dia Mundial de Combate à Crueldade Animal, ou seja, World Event to End Animal Cruelty. A Weeac lançou uma convocação em todo o mundo para que as cidades aderissem a este movimento e, neste mesmo dia, juntos manifestássemos nosso repúdio a todo e qualquer tipo de sofrimento que lhes é imposto.

No Brasil, o convite foi feito a Norah André, que no primeiro semestre organizou manifestações em várias capitais brasileiras contra a vivissecção e a experimentação em animais. Estas manifestações ocorreram no dia 16 de abril e estiveram sincronizadas a partir de um grupo do Facebook chamado Cadeia Para Quem Maltrata os Animais, do qual ela é a moderadora mais ativa.

Agora, com o processo de formalização da Weeac no Brasil, os esforços tem sido no sentido de criar este ativismo abolicionista em caráter permanente. As pessoas que desejarem aderir ou acompanhar nossa atuação podem nos encontrar em 3 endereços:

http://www.facebook.com/pages/Weeac-Brasil/268512176492431

http://weeacbrasil.blogspot.com/

http://www.wix.com/weeacbrasil/br

Brasília é uma das cidades que fazem parte deste movimento. No dia 08 de outubro, nossa manifestação, que está sendo organizada pela representação da Weeac no DF em parceria com ativistas, grupos e coletivos de Brasília ligados a causa animal, será das 16:00 às 19:00 na Fonte Luminosa da Torre de TV. Durante o evento estão previstas atividades educativas, lúdicas e artísticas, além de tendas temáticas que fornecerão material informativo sobre temas relacionados à causa, tais como veganismo, proteção animal, abolição animal, exploração de animais em rodeios, uso de peles e vivissecção e experimentação animal. Ao final, haverá uma vigília silenciosa com luz de velas em uma espécie de luto simbólico pelo sofrimento de bilhões de animais mortos e explorados em todo mundo a cada ano. Todos que desejarem participar podem entrar em contato por meio do nosso blog http://www.weeac-brasilia.blogspot.com/.

Fonte: www.pervitinfilmes.blogspot.com

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